Uma boa notícia para a conservação da biodiversidade: a população de tartaruga-da-amazônia está crescendo! Segundo pesquisa divulgada na revista Nature Sustainability, hoje há nove vezes mais tartarugas nascendo nas praias amazônicas do que em 1977.
A pesquisa foi baseada em 15 praias protegidas no rio Juruá, um dos grandes afluentes do rio Amazonas e base do Programa Território Médio Juruá, coordenado pela Sitawi. Conversamos com João Vitor Campos e Silva, um dos responsáveis pela pesquisa e pelo Estudo do Regime Hidrológico da Bacia do Médio Juruá, para entender de que forma as ações de conservação na região, a participação das comunidades ribeirinhas e o incentivos de projetos direcionados impactam neste crescimento. Confira a entrevista:
1) Segundo pesquisa publicada na Nature Sustainability, hoje há nove vezes mais tartarugas nascendo nas praias da Amazônia do que em 1977. Como é o envolvimento das populações locais no desenvolvimento de cadeias produtivas sustentáveis?
Os quelônios amazônicos possuem uma importância cultural secular para as comunidades ribeirinhas indígenas e não indígenas. Devido à alta exploração, as populações sofreram um declínio dramático, sendo extintas em muitas localidades.
A proteção comunitária das praias de desova tem sido a grande responsável pela recuperação populacional dos quelônios. Nas praias protegidas a predação por humanos dos ovos e das fêmeas é de apenas 2%. Em praia não protegidas a predação chega a 99%.
Vale ressaltar que não são apenas os quelônios que se beneficiam com a proteção, mas um variado grupo que compõem a biodiversidade amazônica, incluindo jacarés, grandes bagres, iguanas, aves migratórias e até invertebrados.
A importância da proteção comunitária é um padrão que se repete para praticamente todas as atividades de manejo. O protagonismo comunitário é realmente elemento central para a sustentabilidade ecológica das cadeias produtivas.
2) Qual é o impacto desse baby boom para a conservação de espécies amazônicas?
O impacto da alta produção de filhotes é a chance de recuperar as populações. O importante é que a entrada de filhotes na população de adultos seja sempre maior que a saída de indivíduos adultos, abatidos pelo consumo.
3) O Programa Território Médio Juruá tem apoiado a conservação de quelônios por meio da formação de Agentes Ambientais Voluntários e ações de apoio à vigilância das praias. Qual é a importância de apoios institucionais como esse para o desenvolvimento de cadeias produtivas na região?
As organizações locais e comunidades rurais tem se esforçado bastante para garantir a continuidade do programa todos os anos. Portanto, apoios dessa natureza são fundamentais, pois eles que garantem a manutenção da atividade. Mas é importante ressaltar também que precisamos de fontes de financiamento mais perenes que possam de fato aumentar a recompensa financeira desse programa. Uma boa perspectiva está nesse experimento de manejo dos filhotes, que pode realmente consolidar uma oportunidade de renda a longo prazo.
4) O Programa TMJ também prevê Estudos do Regime hidrológico da Bacia do Médio Juruá para os próximos 22 meses. De que forma esse estudo poderá contribuir para a conservação de quelônios?
Neste trabalho teremos a oportunidade de avaliar qual é o impacto dos eventos extremos na reprodução dos quelônios. O que acontece quando o rio seca rápido de mais? Qual é a importância das grandes cheias? Essas são perguntas fundamentais para a conservação dos quelônios que serão abordadas neste trabalho. Além disso, tentaremos estimar a mortalidade dos filhotes frente a subida rápida e inesperada dos rios. Isso será fundamental para desenvolvermos estratégias adaptativas que amenizem os efeitos das mudanças globais nesse recurso tão importante.
5) Em 2018, você recebeu o 1º lugar na categoria Mestre e Doutor do prêmio Jovem Cientista, com trabalho sobre o manejo sustentável do Pirarucu. Como as cadeias de valor sustentáveis podem conservar a biodiversidade e promover o desenvolvimento social na região?
A única forma de conseguirmos de fato avançar na conservação da Amazônia é criando caminhos sustentáveis onde as comunidades rurais sejam protagonistas do processo. As comunidades rurais são fundamentais na proteção das florestas e as cadeias produtivas da sociobiodiversidade é a melhor estratégia que temos para alinhar a conservação com o desenvolvimento rural.
O manejo de quelônios faz parte de um amplo quadro direcionado para o desenvolvimento sustentável da região do Médio Juruá, que inclui cadeias produtivas de sucesso como o manejo pirarucu, oleaginosas e açaí. Arranjos comunitários, em que os ribeirinhos protagonizam o desenvolvimento, têm sido utilizados com sucesso na região amazônica, proporcionando resultados positivos e duradouros. Conheça uma das ações do Programa Território Médio Juruá: https://www.youtube.com/watch?v=cvhSpJ-ycFE
Confira os principais resultados da pesquisa, realizada e publicada na revista Nature Sustainability, em: https://youtu.be/q0Th6O39qUo. O artigo pode ser acessado em: https://www.nature.com/articles/s41893-018-0170-5